A revolução das competências é um tema que vem nos impactando há anos e, com a aceleração da transformação digital, tem constituído um pilar central para o avanço do mundo do trabalho e de como as companhias se estruturam para enfrentar desafios atuais e futuros.
Com a escassez de habilidades alcançando nível recorde no mundo — 75% dos empregadores afirmam ter dificuldades em encontrar pessoas com as qualificações desejadas — e as rápidas mudanças que trazem, a todo momento, novas competências para prosperar daqui em diante, empresas precisam urgentemente alinhar o preparo da força de trabalho à velocidade e à dinâmica do contexto em que vivemos.
Para exemplificar essa guinada, nosso estudo ‘Revolução das Competências 2021’ identificou três estágios da evolução da estratégia de talentos.
Primeiro estágio
Denominado ‘Desenvolvedores de Talentos’, diz respeito ao cenário de alta estabilidade, em que as pessoas passavam anos e anos na mesma empresa, tendo tempo e espaço para uma aperfeiçoamento mais prolongado e valorização no longo prazo.
Segundo estágio
Chamado de ‘Consumidores de Trabalho’, está inserido em um momento de globalização, no qual as empresas cortaram custos e focavam em contratar talentos prontos.
Terceiro estágio
Aqui, chegamos ao ‘Desenvolvimento de Ciclos de Talentos’, indo ao encontro da provocação inicial, já que a combinação de instabilidade e de escassez faz com que organizações precisem apostar na formação de talentos, a partir de habilidades necessárias ao negócio, porém, com impacto mais ágil e tempo de valorização mais rápido.
Nesse sentido, a cultura de aprendizagem se apresenta como um caminho para destravar o desenvolvimento de pessoas de forma perene e no ritmo necessário ao colocar o aprendizado como algo contínuo. E o cerne para que profissionais persigam o conhecimento mora na capacidade de aprender (learnability). Essa habilidade já foi prevista por Alvin Toffler, renomado escritor norte-americano, quando disse que “o analfabeto do século 21 não será aquele que não consegue ler e escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender e reaprender”, e se cristaliza como uma necessidade intrínseca à evolução e, por que não, à inovação.
A noção enraizada de aprendizado, muitas vezes, é restrita à idade (só aprendemos quando crianças ou jovens) ou ao local, como escolas e salas de aulas. Tom Vanderbilt, jornalista e pai, ao encorajar a sua filha a aprender sobre piano, taekwondo e outras atividades, viu-se em uma situação contraditória: ao mesmo tempo em que a incentivava a aprender coisas novas, ele próprio não fazia o mesmo. Foi quando se tornou um entusiasta da aprendizagem, realizou pesquisas sobre o tema e se dedicou a aprender novos hobbies, do surf ao malabarismo, pelo prazer em exercitar a neuroplasticidade.
A história de Tom pode nos inspirar a compreender o aprendizado por uma nova ótica. Em um mundo tão complexo e incerto, aprender tornou-se uma postura necessária diante da vida, em qualquer fase, mesmo nas experiências cotidianas — e falo também para além do trabalho. Enxergar o dia a dia como fonte de aprendizado e estar ativamente em busca da ampliação de repertório, seja por meios formais ou informais, nos transforma em eternos aprendizes e nos permite criar novas conexões para lidar com situações que se impõem em nossas profissões e rotinas. O conceito pode ser envelopado como lifelong learning, ou aprendizado ao longo da vida, e vem sendo bastante discutido no ambiente corporativo.
Notando que encontrar talentos prontos, mesmo pagando a mais por isso, não é mais a saída, empresas estão se dedicando a estruturar uma cultura de aprendizagem que incentive pessoas a despertarem e cultivarem a capacidade de aprender, para que assim possam aproveitar ao máximo as oportunidades diárias — nas trocas com colegas, nas análises de cenário, nas avaliações de progresso — e também os programas de treinamento e desenvolvimento.
Programas esses que seguem a necessidade de rapidez e ciclicidade, por isso, são conhecidos como “bite-size”, ou “tamanho de uma mordida”, o que significa que tendem a ser mais breves, mais relevantes, de fácil acesso, para funções específicas e com aplicabilidade e reconhecimento no curto prazo. Em porções menores e direcionadas, mais chances de as pessoas se engajarem, absorverem e utilizarem o que aprenderam.
E se lembram de Tom? Assim como ele, líderes têm papel fundamental no enraizamento da mentalidade de aprendiz e do desenvolvimento, não apenas ao encorajar as descobertas da equipe, abraçar falhas como meios de aprender, mas também ao realizar suas próprias jornadas de aprendizagem e compartilhar seus achados com as pessoas.
Líderes também são cruciais na superação de dois grandes obstáculos identificados para uma cultura de aprendizagem de sucesso. O primeiro problema é que, muitas vezes, o processo proposto requer que profissionais dediquem tempo fora do horário de trabalho ou, ainda que seja dentro do expediente, as demandas não se adaptam ao período do dia destinado à aprendizagem. O resultado é um descompasso entre o que a empresa recomenda e o que ela cobra. Em seguida, vem a dificuldade em ver o conhecimento em aplicações reais, ou seja, treinamentos que são feitos fora de contexto.
Para esses dois empecilhos, as lideranças seniores e gerenciais podem agir abrindo janelas no planejamento das atividades para que as pessoas tenham tempo e espaço para aprender — seja por meio de Planos de Desenvolvimento Individuais ou em equipe —, além de convocar momentos de aprendizagem para que as pessoas possam estruturar ideias, receber orientações para questões práticas e ainda compartilhar e discutir aprendizados.
É importante que, neste ponto, as conversas de carreira e a avaliação de competências caminhem lado a lado para equilibrar os interesses e os objetivos profissionais de cada colaborador e as necessidades e as estratégias do negócio. Posto isso, o reconhecimento e a valorização pela evolução profissional devem constar nas ações que fomentam uma cultura de aprendizes permanentes.
Aliada à contratação, à criação de uma comunidade de habilidades e à migração de profissionais dentro da empresa, a formação de talentos é uma grande potência com a qual as empresas podem contar para sair do estágio de ‘consumidoras de trabalho’ e saltar para ‘desenvolvedoras de ciclos de talentos’, direcionando seus esforços na construção de um ambiente e de clima favoráveis ao próprio aprender, movimentando esta própria capacidade. Assim, seja qual for a demanda de competências daqui meses ou anos, as pessoas estarão encarando a aprendizagem como parte do fluxo de trabalho e, portanto, estarão mais aptas a captar novas habilidades para fechar lacunas que despontam meio às transformações.
E a sua empresa, como vem lidando com a estratégia de talentos do ponto de vista de Treinamento & Desenvolvimento? Existem programas para lideranças também? Comente aqui e seguimos com a conversa.
Abraços,
Ana Guimarães
Diretora de Operações no ManpowerGroup Brasil
Publicado originalmente em: https://bit.ly/3TkGMnh